Durante um programa televisivo uma história interessante passada em
Portugal, atraiu a minha atenção. Felizmente que esta historia teve um desfecho feliz para a
adolescente e para os pais dela.
Todavia, tomei conhecimento da mesma história, antes de a
peça passar na TV, através de um jornal diário. A notícia fazia referência a
uma adolescente, de 13 anos, que foi dada como desaparecida de casa dos pais. Ninguém
sabia dela.
Deixou uma carta aos pais afirmando “ Saí de casa porque vou participar
num concurso televisivo.”Não recordo, ao pormenor, o conteúdo da carta, mas
pelo menos a intenção da adolescente na carta, era mesmo essa. Ao ler,
imediatamente, pensei no pior dos cenários e no sofrimento dos pais. Felizmente,
uns dias depois apareceu sã e salva. Todavia, esta adolescente apareceu com uma
história para contar aos TODOS adultos, que são pais ou aqueles que façam intenção
de o ser.
Assisti ao relato sobre esta história rocambolesca quando a
adolescente, na presença dos pais, apareceu num programa de televisão. O
apresentador do programa, perguntou-lhe “Diz-nos lá o que é que aconteceu para
fugires de casa dos teus pais”. Segundo a adolescente, fugiu de casa, porque não
suportava mais que os pais a sobrecarregassem de tarefas domésticas, de não ter
tempo para estar com amigos/as, por estar sempre a trabalhar, a ser repreendida,
pressionada e submissa, de substituir a mãe na educação de 3 irmãos, de ajudar
o pai e durante a ausência da mãe era a adolescente que ocupava o seu lugar,
com treze anos.
Procurei ouvir atentamente o relato da sua fuga. A
adolescente pareceu-me ter um discurso coerente, honesto, realista, espontâneo
e com a noção do certo e do errado. Esta criança, estava perante as câmaras, na
companhia dos seus pais, a afirmar e admitindo que aquilo que tinha acabado de
fazer estava errado, pareceu mostrar indícios de arrependimento, mas pareceu
também mostrar revolta, indignação, frustração e maturidade.
Pensei “Com 13 anos, esta rapariga foi uma corajosa...” ter
desaparecido de casa foi a forma como ela decidiu inverter a situação que
considerava insustentável. Obviamente, que não estou a afirmar que este tipo de
comportamento, adoptado pela adolescente seja o correcto, mas gostaria de expor
o seguinte através de uma questão. Nesta família, e segundo o relato da adolescente,
na presença e com a confirmação dos pais, a situação era insustentável, quem
era o/os responsáveis de forma a zelar pelos direitos da criança, de forma a
prevenir uma desfecho trágico, com eventuais consequências dramáticas, que
felizmente acabou por não acontecer? Será justo a adolescente não ter tempo
para si mesma, em prol dos interesses egoístas dos pais? A resposta é, não é
justo.
Foi referido pelo apresentador do programa, que uma psicóloga que assistia prontificou-se, imediatamente, a ajudar
a criança. Pensei "Ok, ajuda para a adolescente...” logo de seguida
exclamei “E os pais?! Eles é que precisam de ajuda. São adultos e pais. Com
deveres e responsabilidades para com os filhos.”
Mais uma vez, concordo que esta criança necessite de apoio,
mas aquela família, principalmente os progenitores, aparentam estar a
negligenciar a educação e o desenvolvimento necessário que promova o bem-estar da
adolescente e dos irmãos mais novos. Eles, os pais, acima de tudo é que
precisam de apoio e de orientação, porque aquela adolescente, está a sofrer.
Durante muitos anos em Portugal, ao longo de gerações, a
educação das crianças, nunca entendi bem as razões desta permissão ou aceitação
pelos adultos e sociedade em geral, era valorizada, acima dos estudos, pelo
trabalho. Onde estavam os defensores dos direitos das crianças? Advogados, jornalistas, padres, professores, médicos… As crianças começavam a trabalhar aos 10, 12 ou 13 anos, para ajudar
no sustento da casa, segundo afirmam. O trabalho infantil era considerado um
recurso na família e explorado pela sociedade. Hoje, em Portugal, em pleno sec.
XXI ainda existem situações reminiscentes em relação ao sec. XX (100 anos).
Considero vital para o desenvolvimento das crianças até a
idade adulta a componente social. A relação com os pares, explorar o mundo dos
adultos, os valores morais da sociedade (certo e errado, justo e injusto), desenvolver
relações significativas, adquirir competências na gestão das emoções (ex.
assertividade, a lidar com a frustração e raiva), relacionamento, de confiança, com figuras
adultas e autoritárias. A adolescência é uma fase de aquisição e estruturação da
identidade, em que se adquire competências para viver o mundo que nos rodeia e
encontrar o lugar nele (propósito e significado).
Como pai e profissional, aprendi uma lição de uma
adolescente determinada e suficientemente capaz de encontrar soluções para a
sua vida, insuportável. Hoje as coisas na sua casa devem ter mudado,
provavelmente, agora sente que pode ser adolescente, antes que os adultos
teimem em impor regras que desvalorizam os direitos das crianças. O mundo dos
adultos não é seguro para algumas crianças vulneráveis