Nos últimos meses tenho recebido vários emails de mães, assustadas
e impotentes, perante o eventual fenómeno do consumo e/ou dependência de drogas
ilícitas.
Uma das questões mais comuns: “O meu filho de 16 anos
consome haxixe. Ele diz que não há problema, mas estou assustada, será que ele
pode ser toxicodependente?”
Prevenção que não previne, pelo contrário.
1. Hoje em dia, um número muito significativo de crianças e
jovens está exposto e vulnerável perante o fenómeno do consumo excessivo de drogas
lícitas, incluindo o álcool, e as ilícitas e em relação a este fenómeno sabemos
apenas a ponta do iceberg, isto é, não
existe prevenção em Portugal.
2. Um número significativo de jovens faz consumos
concomitantes de bebidas alcoólicas e canabinoides (haxixe e marijuana). Através
da minha experiencia profissional, atualmente o consumo de substâncias
psicoactivas ilícitas, canabinoides (http://www.doping-prevention.de/pt/substances-and-methods/cannabinoids/cannabinoids.html),
faz parte de um acto social, idêntico ao consumo de bebidas alcoólicas, que
desde os anos 80 tem ganho cada vez mais adeptos. Quais são os efeitos a medio
e longo prazo, nos jovens sobre o consumo excessivo e concomitante entre as
bebidas alcoólicas e os canabinoides (THC)? Não conheço a resposta nem existe
investigação.
3. A guerra global às drogas existe desde os anos 70 e está
longe de acabar. Aquilo que sabemos é que a oferta (trafico) supera a procura
(consumo), eis um exemplo muito prático, se um jovem curioso está interessado em consumir e experimentar os
efeitos dos canabinoides, não tem muito trabalho e/ou esforço para conseguir
obter a desejada substância. É mais simples, do que possamos imaginar. Há 25
anos atrás um jovem que quisesse encontrar, por exemplo haxixe seria mais
difícil, hoje não. Por exemplo, no outro dia li num jornal, que um jovem foi
detido, na sua escola, por se dedicar ao tráfico de drogas. Ficamos alarmados,
mas de certeza que não é um caso isolado.
O que é que acontece
quando o consumo de drogas ilícitas entra em casa, de rompante?
Frequentemente, quando surge no seio familiar, evidências sobre
o consumo de substâncias psicoactivas ilícitas, canabinoides, pela criança/adolescente,
a reação da mãe, quanto ao pai é o ultimo a saber, é de choque; “ E agora? O
que é que vamos fazer?” Por exemplo, quando uma mãe aborda o assunto do consumo
com o filho, a resposta é: “Mãe, não estejas preocupada porque eu sei o que
estou a fazer. Sabias que o haxixe é uma droga leve? Sabias que o álcool é mais
perigoso que o haxixe? Eu não fumo muito, é só de vez em quando.” Perante esta
resposta, mais ou menos esclarecedora, do ponto de vista da mãe, esta fica mais
tranquila, pensa que o filho está devidamente informado e é responsável por
aquilo que faz, algumas mães ainda teimam, indecisas, em tom de ameaça velada
“Vê lá o que andas a fazer, porque se o teu pai sabe disso já sabes como ele é”.
Sem explorar mais dinâmicas na família (interação filho e mãe/pai) em relação
ao assunto, de acordo com a resposta do filho, podemos pensar em duas questões:
1. O assunto da prevenção sobre o
consumo de cannabinoides, na família, não foi abordado 2. com a agravante de a informação que o filho possui,
provavelmente foi obtida na rua com os amigos que também fumam e ou na internet
“O haxixe é uma droga leve. O álcool é
mais perigoso que o haxixe, por isso devia ser legalizado.” A
criança/adolescente pensa: “Só é perigoso se fumar muito, por isso, se fumar de
vez em quando não faz mal.” Sabia que apesar do haxixe não provocar
dependência, pode tornar-se um hábito? Sabia que o nível de THC, ingrediente
psicoativo toxico (http://pt.wikipedia.org/wiki/Tetraidrocanabinol)
[i]
que potencia o efeito, é elevado, comparado com o nível de THC de há duas décadas?
Sabia que apesar de ninguém morrer com o consumo excessivo de cannabinoides,
todavia, em alguns indivíduos, pode conduzir á loucura? Sabia que, na última
década, os pedidos de ajuda, por exemplo no Instituto de Droga e da
Toxicodependência (http://www.idt.pt) e outras
instituições relacionados com o consumo excessivo de cannabinoides aumentaram
significativamente? Sabia que as substâncias psicoactivas (sistema nervoso
central) interferem no desenvolvimento normal do cérebro humano que só completa
a sua maturação aos 21 anos de idade? Na minha opinião, pessoal não existem
drogas leves nem drogas duras, é um mito, existem drogas psicoactivas, de
acordo com as suas especificidades.
Adiante, voltemos ao assunto da família. Se as consequências
relacionadas sobre o consumo dos cannabinoides se agudizam, no comportamento do
filho (por ex. absentismo escolar, impulsividade, perda da memoria e concentração,
euforia, pequenos delitos, isolamento da família – o convívio familiar é
comprometido em prol do convívio com os pares; ex. deixa de haver horários para
entrar e sair de casa, para as refeições, a família não conhece os amigos) estão
reunidas as condições para uma crise na estrutura familiar, e caso não sejam adotadas
medidas integradoras e construtivas, pode comprometer seriamente a comunicação
e a coesão familiar (estrutura/hierarquia).
Quando a questão do hábito do consumo de canabinoides e as
consequências negativas é do conhecimento geral de toda a família, o foco da
atenção é direcionado para o membro (criança/adolescente): Por exemplo, varias tentativas
para interromper o hábito dos consumos, censurar e castigar, ameaças que não se
cumprem e/ou tentativas em negar ou minimizar o problema. Apesar de este tipo
de abordagem, funcionar em alguns casos, creio que não funciona na maioria
deles. Um dos fatores que pode contribuir para o aumento exponencial da crise
na família são o surgimento de quezílias antigas entre os membros da família (exemplos;
defeitos de caracter, ressentimentos, remorsos e mágoa, divorcio,
infidelidades, segredos) que complicam, ainda mais a abordagem do problema do
habito e as consequências do consumo, assim como a solução. A dinâmica e
hierarquia familiar (crianças, adolescentes e adultos) podem tornar-se caóticas,
por exemplo através da agressividade ou passividade, da troca de acusações, na
procura de culpados. Perante um problema na família, quem é o responsável por
gerir os recursos da família? Quem é o responsável pelas decisões na família?
Quem é o responsável por assumir determinados riscos na família? A hierarquia
familiar está sustentada em valores e tradições que fomentam o diálogo? A
coesão? A confiança?
Se fossemos à procura de culpados para eliminar o problema das
dependências, o mais provável é que seriamos todos nós. Depois, tal como foi
referido anteriormente, o fenómeno das drogas veio para ficar. Vivemos numa
sociedade capitalista em que o lucro (poder económico) está acima dos direitos
e das liberdades da criança. Não existe vontade dos líderes políticos e na
justiça (leis) quanto à prevenção das dependências. Na realidade, quando uma criança/adolescente,
decide voluntariamente, consumir canabinoides e esse tipo de comportamento o
conduz ao hábito, não existem culpados. O fator mais importante, na minha
opinião, é a forma como a família se organiza e se estrutura em torno do
problema, em vez de criar mais problemas. Afinal, o mais importante é o apoio à
criança/adolescente.
Na crise familiar é extramente importante restabelecer o diálogo,
a coesão, definir um plano e limites, regras que salvaguardam a instituição
familiar -“O todo é mais importante que a soma das partes.” Só somos livres se
vivermos de acordo com as regras instituídas, quer seja na família ou na
sociedade, caso contrario, teremos que assumir as consequências dos nossos atos,
quer sejamos crianças, adolescentes ou adultos. Na natureza não existem
culpados, existem consequências.
Dicas:
1. Antes que surjam indícios sobre o consumo de substâncias
psicoactivas lícita, incluindo o álcool, e as ilícitas, da parte do seu filho, aborde
o tema da prevenção das dependências. Procure ajuda. O seu esforço e o seu
investimento, neste tema, pode revelar-se recompensador, a medio e a longo
prazo.
2. Questão: Quais são as regras instituídas pela família quanto
ao consumo de substâncias psicoactivas lícitas, incluído o álcool e o tabaco, e
as ilícitas? Se não existem regras definidas e esclarecidas por todos, trate de
implementar, com os membros da sua família, antes que surjam factos e
evidências, porque depois pode ser tarde. Como progenitor, dê o exemplo na
aplicação das regras.
3. Se o seu filho consumir substâncias psicoactivas,
canabinoides, isso não significa que ele/ela vai ser um dependente. Todavia,
promova o diálogo sobre o assunto; não desvalorize ou sobre valorize. Trabalho
de equipa: promovam atividades em família na pesquisa, atualização e informação
sobre os efeitos do consumo excessivo de cannabis.
4. Caso exista na família um historial de doenças mentais
(depressão, ansiedade) ou dependência de drogas, incluindo o álcool, esteja atento/a caso o seu filho seja consumidor de
substâncias psicoactivas (ex. canabinoides) e informe-o das possíveis
consequências, porque o consumo pode despoletar e/ou agravar os sintomas da
doença (hereditariedade).
5. Treine o ouvir, sem interromper e sem fazer julgamentos de
acordo com valores moralistas e desatualizados pela sociedade. O que é que
ele/a pensa sobre o consumo? Qual é a atitude dele perante este comportamento?
Avalie se ele/a ouve, se é responsável, se tem auto crítica, se aquilo que diz
é coerente com aquilo que faz.
6. Faça perguntas, se quer obter as respostas que pretende.
7. Peça ajuda
Facto: Desde 2007, ano da existência deste blogue, até aos
dia de hoje, ainda não recebi um único email de pais assustados em relação ao consumo
e/ou abuso de bebidas alcoólicas. Você sabia que as drogas mais perigosas são
as drogas lícitas? Refiro-me ao álcool e ao tabaco.
[i] Nota:
Pesquisei a palavra Delta9 Tetrahidrocanabinol, também conhecido por THC no portal da
saúde, no portal do IDT e não obtive qualquer resposta. Aparentemente, a prevenção das
dependências não existe em Portugal.
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